A queda da institucionalidade mágica

Dedicado ao Jota, ao Pelicano & outros anônimos brilhantes


Esses dias um amigo que acompanha o meu conteúdo assiduamente veio me falar do tanto que eu mudei ao longo dos últimos anos. Eu recebi essa fala com certa surpresa e curiosidade. Ele continuou: disse que era muito visível o meu amadurecimento e o acúmulo de experiências que eu tive nesses últimos cinco anos. Disse que eu me tornei menos inflexível, mas que eu continuava firme. E que era óbvio o quanto a minha visão de mundo se alargou. Que não sabia se era devido à quantidade de entrevistas que eu conduzi com pessoas diferentes, mas que eu parecia muito mais aberto às perspectivas diferentes da espiritualidade. 


Eu fiquei feliz ao ouvir as impressões dele. Mas também me quedei pensativo. As impressões dos outros são sempre muito reveladoras, é pelo olhar alheio que identificamos padrões e posturas que a nossa miopia cognitiva não nos permite. E o que mais me chamou a atenção em sua fala foi a descrição dessa flexibilidade que eu adquiri. 


Essa qualidade é consciente. Eu demorei para entender que é a pluralidade de fontes que nos confere recursos para permitir a expressão ideal da nossa Essência. Essa inflexibilidade que eu parecia ter anteriormente era fruto de um apego a qualquer suposta tradição, uma necessidade de pertencimento, qualquer nível de apreço a certificados de legitimação de uma espiritualidade que pudesse ser averiguada e comprovada por qualquer grupo que soasse importante. Uma limitação afetiva. Carência ou necessidade de validação? Vaidade ou insegurança? Talvez tudo isso?!


Hoje eu abomino todo e qualquer tipo de fundamentalismo, o tradicionalismo esnobe, a erudição insensível e as limitações cognitivas que se adquirem ao participar de qualquer grupo que não tenha por prioridade a expansão da consciência de forma autêntica e genuína. O que é triste é saber que muitas são as instituições que levantam essas bandeiras sem serem capazes de realmente praticá-las ou - o pior - sem realmente terem tal intenção.


Ao longo dos últimos anos eu fui me desconectando de todas as ordens iniciáticas das quais eu fiz parte. Algumas por que já não tinham muito para me acrescentar. Outras por que a associação com elas me era prejudicial energética e espiritualmente, e demorei para entender isso. Outras, por decepção com a postura e conduta de outros membros. E ainda haviam aquelas que tinham propostas maravilhosas, mas que seus métodos não levariam ao cumprimento do que era objetivado.


Essa cisão com a institucionalidade mágica me foi muito decepcionante. Eu ainda gostaria de participar de um grupo, de uma egrégora, com valores realmente fiéis, bem fundamentados, e que possui condições de cumprir aquilo que é proposto. Eu ainda sonho com uma reunião de adeptos verdadeiramente dedicados ao cumprimento da Grande Obra, sem as distrações da vaidade que assolam o ocultismo e o espiritualismo em geral. Eu descobri que esse grupo existe, mas não fisicamente. Em geral, um ou outro desses indivíduos cruzam o meu caminho. E quando eu os percebo eu não os deixo passar. Rapidamente me apronto para estabelecer relações de amizade e de troca de experiências, pois sei que estes são mestres muito mais valiosos do que o conhecimento curricular e institucionalizado das ordens visíveis e disponíveis em nossos meios. 


Olhando para trás, eu acho que essa definição de valores sólidos é que é responsável por todo o amadurecimento e pela flexibilidade que o meu amigo descreveu em mim. A troca da valorização da instituição pela valorização do indivíduo. A dissolução do monopólio curricular e o reconhecimento da preciosidade que é a experiência espiritual realmente vivenciada e consagrada em atos.


Acho que no final das contas o segredo está no lastro que deixamos no mundo. As ordens vivem da memória de suas conquistas e seus afiliados nada fazem para ser dignos dos registros que outrora tiveram qualquer valia. Mas os indivíduos que vivem a verdadeira espiritualidade rapidamente se destacam das ordens pois o seu trabalho é mais amplo do que as definições de suas cartilhas e o contraste de sua atuação no mundo rapidamente se evidencia: ele não é um afiliado, ele é um verdadeiro iniciado que por ventura faz parte daquela organização. Sua sabedoria não é produto daquele currículo, no máximo tem um grau de referência ou inspiração, mas a sua trajetória é produto direto de sua ação no mundo, e é isso que importa.


Realmente, não me interessam mais os papéis e certificados, e nem o reconhecimento alheio. O que me interessa é gente real, vivendo sua verdadeira história e espiritualidade…

Acho que é verdade, eu estou mudando muito.

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