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Mostrando postagens de março, 2011

Indefinível

As nuvens casam-se sobre mim. Interpõem-se sem qualquer pudor e dão novas formas ao céu. Minha imaginação, dotada de asas, alcança o paraíso. E nessa altura meus olhos já foram tomados e encerram-se diante dos raios do sol que cobre minha face. O céu se desconstrói e eu me faço daltônico: as cores perdem suas individualidades e tornam-se ilimitadas. Tenho, então, o Todo ao meu dispor. As sombras, extintas, assim como as dúvidas, revelam-me o céu aberto, imponente em sua simplicidade. E o despertar faz-se segundos antes do abrir das pálpebras. E a meia constatação define o caos, indefinível: “ tempo estrano ” Pois nada é verdadeiro; e tudo é permitido.

Delírio

“Quer pouco, terás tudo. Quer nada, serás livre” Fernando Pessoa O mundo se delicia em suas entrelinhas. Enquanto as passagens, transições, fazem-se ligeiras e indelicadas, o eterno permanece intocado. O apogeu é atemporal. Incompreendido em essência, e relevado em detalhes. Nem o relevar, nem o revelar. As frestas aos curiosos, o despertar aos desapercebidos. E os despercebidos contentam-se com o palpável. A pretensão matou a expectativa. A palavra, desprendida do papel, difere-se da ovelha desgarrada do pastor, em liberdade. O infinito abomina descrições. O homem, despido de desejos, depara-se com a vontade, como em um reflexo de si mesmo. Aquele que atravessa o espelho torna-se, sobretudo, divino. Aos demais, insuficientes em suas reflexões, sobra o fardo narcisista.

Desencontros

Quis tanto te contar o quanto tua, nossa, cena me marcou que até me esqueci o que ia dizer.

Soneto

Dizeis-me que sou um poema. Que agrado à todos, cada um com suas contentes lembranças que tiram de mim e que, afinal, em essência, não sou nenhuma destas lembranças. Dizeis-me que sou esta poesia porque trago alegria, mas, por trás de máscaras de palavras, este sim, sou eu, triste. Dizeis-me que me queres curto, para que possa levar-me contigo no bolso, sem que o vento ameace tirar-me de ti. Mas, querida, esqueces que a poesia é livre; e esqueces que a tristezza é complexa demais para ser curta. E que mesmo o curto não está a salvo do furto. E dizeis-me que me queres rimado. Que ressôo como eco em teus ouvidos por horas a fio. E lhe desperto calafrios ao som das lembranças dos sussurros. E, posso sim, ser melodioso. Mas não me peças para ser métrico, que sou inconstante demais para isso. Exigistes de mim o término em reticências, mesmo sabendo-me ser tão definitivo... E sabeis que a minha vaidade não permite um refrão extra após o ponto final. Que, se afinal sou um poema, sou um soneto