Tratando das Sombras

Me perguntou se eu tinha medo de lidar com as sombras.

Eu pedi para ele olhar de novo. Perguntei se o que ele via era medo, ou se era eu quem escondia os meus trabalhos muito bem. 

Calou-se.

Comentamos que eu tinha mais inimigos mortos do que vivos.

Ele disse que isso não era nenhum mérito...

Concordei. Mas acrescentei que eram ossos do ofício.

Ele amenizou: disse que todo movimento gera uma reação. Que eu era o movimento, que eu tinha de lidar com as reações.

Eu ri. Há alguns dias tivemos a mesma conversa e eu não havia enxergado a simplicidade dessa lógica: eu era o movimento inicial, criativo. Todo o demais era mero desdobramento. A conclusão sempre se reporta ao que lhe inaugura. Enquanto operador, eu desencadeava os fenômenos, eles me obedeciam. Essa é a lógica.

Ele riu. Era mais simples do que eu imaginava, mas eu havia entendido. Isso era lidar com as sombras. E, de fato, eu havia as escondido bem.

Ele se despediu. Mas antes de ir, me pediu permissão para dar um último conselho.

Eu assenti, claro. Aquilo era uma honra.

Ele me disse para que eu cuidasse de amar os meus inimigos. Que eu não sepultasse ódio, e que minha doçura pudesse ser tal como a minha intrepidez para que ela fosse capaz de amenizar o amargor daqueles que caíssem por mim.

Ele riu.

Eu engoli a seco.

Era um elogio. Mas também era uma advertência e uma profecia. E eu a entendi três vezes. E agradeci em silêncio. Ele já partira. 

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