O Teatro do Informe e a Salvaguarda do Cinismo


Viu-me e mudou de assunto. Emudeceu-se, ou quase isso. Antes, porém, me maldisse – mas pelas costas que é como fazem os algozes. Eu que nada sabia, e que mesmo que isto alegasse, já era mal visto: são os olhos quem julgam, o julgamento já é o prenúncio da pena, mesmo que o réu seja algo de inocente. Nunca se passa incólume por um júri.


Saber demais pode ser um estorvo. É sobre essa premissa que se constrói a relação entre o Conhecimento e o Abismo: a multiplicidade das interpretações seduz o ávido à ilusão. É a oportunidade que a dualidade oferece que acaba por confundir o incauto. E somos incautos todas as vezes que atribuímos feitos às sombras, acaba-se por projetar demais.


Mas o teatro do informe tudo aceita. Aliás, o ator consagrado é capaz de entregar o que quiser para a plateia, mesmo sob delírios alucinados. Eu, entretanto, sempre preferi o cinismo a me defender abertamente, sobretudo por que estes palcos e espetáculos não costumam comportar a discrição, sendo muitas vezes a sonora gargalhada minha melhor atuação.


Ainda assim esse registro. Não uma resposta, ou defesa, ou um relato a ser levado em conta, apenas um ponto. Não estou certo se definitivo, mas também não pretendo mudar de assunto repentinamente ao me deparar com qualquer dita assombração. Acho que é essa a integridade que eu quero para mim. Menos não me atende.

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