Dios Nudo
- O que
você quer da vida?
- Idealmente?
- É.
- Bem, eu
gostaria de possuir a Estátua da Liberdade.
- A Estátua
da Liberdade?! Por que?
- Eu acho a
Estátua da Liberdade o maior símbolo da ironia moderna! E é mais genial ainda
quando você pensa nela ilhada e distante da população, segurando a tocha em
meio ao oceano.
- Eu nunca
tinha pensado dessa forma... De todo
jeito, não é o monumento mais bonito. Digo, em todos os sentidos.
- Não
mesmo. Eu só a escolhi pela brincadeira. Tenho algum receio do Sonho Americano
e da metonímia do Ideal. A exaltação
do excesso e a política do desnecessário: uma fantasia, um luxo, o esporádico,
a curiosidade que mata o gato.
- Como
assim?
- Assim. Agora,
por exemplo, eu comecei a me preocupar em onde eu colocaria a estátua se eu a
tivesse. E é um problemão. É claro que eu poderia desejar uma casa grande, com
um jardim exuberante e usá-la como espantalho, mas por que eu divagaria? Eu
acabaria me adiantando, e o presente é o verdadeiro ideal.
- É o futuro
o ideal do presente?
- O ideal é
como o Pleroma: falar sobre ele lhe distancia da concepção. Aliás, o Pleroma
não deixa de ser o Ideal. Logo, o ideal do presente é o próprio presente.
- O
conformista sente-se confortável?
- Quase. O
conformista despercebe o conforto, apesar de aproximar-se da sensação da
plenitude. No entanto, o que ele vivencia é o marasmo da existência. Ao
contrário do homem confortável, em estado de nudez com Deus, que sente seus pelos
eriçarem com a menor brisa que lhe toca.
- Então há
diferença entre as duas facetas?
- Há um Abismo!
É claro que estas são apenas denominações, figuras arquetípicas...
- Mas o que
é que aparta o conformista do conforto?
- É uma
questão de livre arbítrio. De autoestima essencialmente, mas esta também é uma
opção do ser. Confortável é aquele que tem-se por ideal, e note que não há
qualquer itálico em tal idealismo, pois é um ideal ímpar. Mas o conformista não
sabe vivenciar a sua individualidade. É o que o faz importar conformes e ideais e vivenciar o escapismo do autojulgamento.
- Medíocre
por assim se crer.
- Pobre de
crença.
- A
concepção do ideal é a verdadeira humildade: aceitar a si e, portanto, ao
mundo. Eis o êxtase do espontâneo: parir-se, dar-se à luz, enternecer-se. É
este o conforto do qual eu lhe falo e do qual a vida não poderia conceder-me,
posto que já me pertence. É este o sorriso que conclui as frases e estampa o
silêncio.
- Pois gato
que não sorri, morre de curiosidade.
***
- Posso te
fazer uma última pergunta?
- Claro!
- E se você
chegasse a realmente pôr as mãos na Estátua da Liberdade algum dia?
- Eu abria
um escritório de advocacia.
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