Insônia
ao som de Bonobo - "Sleepy Seven"
“Você não
vai conseguir dormir” repetia dentro de sua cabeça a voz em tom resoluto. A
escuridão confortável àqueles olhos sensíveis extingue-se com a porta
abrindo-se. O dia nasce e quer entrar e os pássaros comemoram longe.
O quarto velado
por roncos leves de quem está em repouso profundo e o barulho da goteira que
distrai quem não tem este conforto. A paz alheia sempre trouxe muita inveja ao
mundo e há aqueles que não conseguem se aquietarem instantaneamente, com uma
cabeça incessante quando todos já desmaiaram e foi anunciado o término da festa.
Pensamentos que sufocam sonhos, o sono perdido na noite finada.
A tranquilidade
do ambiente se desfaz num tormento próprio, invisível aos demais: Morpheu
renegou-o e o dia é um fardo. A porta aberta revela a poça de água se
expandindo por um chão tomado de cobertores e colchões, entrelaçados em uma
orgia de roncos e suspiros da qual ele havia sido excluído. Que se afogassem
todos num sonho líquido comunitário!
Já não
contava carneirinhos pulando uma cerca qualquer, mas as gotas que iam do teto
ao solo, numa vaga esperança de esquecer a profecia das vozes em sua cabeça.
Odiava os monólogos internos que tinha consigo, principalmente nos finais de
festa em que via os vestígios de uma escassez de propósito por todo canto.
Talvez estivesse ocupado demais com a sua consciência para conseguir cerrar os
olhos; talvez já não houvesse reparo se não reparar... Como eram hipnóticas as dobras
que os vestidos das garotas assumiam naquele breu, num convite agora expirado, tardio.
O laço que se desfez e as rugas que se fizeram: amarrotado nos créditos, tela
preta, fim de filme.
Deteve-se em
seu leito improvisado sem atravessar linhas imaginárias ou desmascarar
fantasias. Sua realidade particular o bastava: detalhada e delineada sob
medidas, exclusiva! Dançou em seus trapos observando o aposento que dividia com
os outros de olhos empapuçados de areia, enquanto os dele, leves e limpos,
davam-lhe a oportunidade de assistir o quarto tomado pela calma.
Desconhecia
o tempo. Horas e minutos são do terreno do comum e o público as aplaude em
conjunto, porém aquele cómodo já não se situava no convencional ou no
cotidiano, senão num teatro de ilusões cujo palco envolvia suas marionetes
inanimadas e seu astro desperto em contemplações múltiplas.
As paredes
ganhavam vida e suas fissuras e rachaduras eram cicatrizes que remetiam a
histórias antigas. Os quadros como adornos, vívidos como as imagens na
televisão, aprofundavam o ambiente, executavam os limites e projetavam-no em
paisagens atemporais que o recebiam cordiais como quadros devem se portar aos
olhos de quem os admira.
O
estrangeiro então adentrava às pinturas num mergulho longo e demorado, em um
impulso por liberdade e, imerso em devaneios, perdeu-se em seu oceano.
Do lado de
cá, no quarto, a calma de sempre, perpétua:
A poça d’água
crescera além das proporções.
Admito: meu preferido nos últimos tempos.
ResponderExcluirIdem! hahaha
ResponderExcluirIdem! hahaha [2] (ok, esse e um que tinha a ver com o The Cure. Não vou me lembrar qual no momento :B)
ResponderExcluir